"Para fidelizar de verdade o
cliente, esqueça mimos e supérfluos. Basta resolver seu problema".
A tese de que a empresa deve “encantar” o cliente está tão
enraizada que a gerência raramente faz uma pausa para examiná-la. Mas aqui vai
uma pergunta: com que frequência alguém prestigia uma empresa só porque o
atendimento é fora de série? É bem provável que o leitor lembre de um punhado
de exemplos, como o do hóspede que faz questão de voltar a um hotel cujo
pessoal é particularmente atencioso. Mas provavelmente não serão muitos.
Agora pergunte: quantas vezes um consumidor abandona uma empresa devido a um
péssimo atendimento? O tempo todo. O consumidor se vinga da companhia aérea que
extravia sua bagagem, da empresa de cabo cujos técnicos não aparecem na hora
marcada, da operadora de celular que o deixa pendurado no telefone, da
lavanderia que não entende o significado de “urgente”.
O impulso do consumidor a punir o atendimento ruim — pelo menos com mais
presteza do que a premiar o atendimento primoroso — é altamente visível tanto
na interação por telefone como no autoatendimento, maiores canais de serviço ao
cliente da maioria das empresas. Nesses cenários, revela nossa pesquisa, a
lealdade tem muito mais a ver com a capacidade da empresa de honrar sua
promessa básica (por mais modesta que seja) do que com o espetacular que a
experiência do atendimento possa ser. Mas a maioria das empresas não percebe
isso e paga caro em termos de investimento jogado fora e clientes perdidos.
Para examinar o elo entre atendimento ao cliente e fidelidade, o
Customer Contact Council (divisão do Corporate Executive Board) fez um estudo
com mais de 75 mil indivíduos que haviam interagido por telefone com
representantes de centrais de atendimento ou usado canais de autoatendimento
como internet, atendimento telefônico automatizado, chat e e-mail. Também
fizemos centenas de entrevistas estruturadas com líderes de centrais de
atendimento e seu equivalente funcional em grandes empresas ao redor do mundo. Abordamos três questões:
• Qual a importância do atendimento ao cliente para a fidelidade?
• Que atividades do atendimento ao cliente aumentam a fidelidade e
quais não?
• É possível aumentar a fidelidade sem elevar custos operacionais do
atendimento ao cliente?
Houve duas constatações cruciais, que deveriam afetar a estratégia de
atendimento ao cliente de toda empresa. A primeira é que encantar o
cliente não produz fidelidade; reduzir seu esforço — o trabalho que deve fazer
para ter seu problema resolvido —, sim. A segunda é que agir deliberadamente
com base nesse insight pode ajudar a melhorar o serviço ao cliente, derrubar o
custo do atendimento e reduzir a perda de clientes.
Esforço excessivo
Segundo a opinião popular, o cliente é mais fiel à empresa que se
desdobra para agradá-lo. Nossa pesquisa sugere, no entanto, que superar
expectativas do cliente durante interações de atendimento (oferecer um
reembolso, um produto grátis ou uma cortesia como frete expresso sem custo
adicional, por exemplo) só o torna marginalmente mais fiel do que quando suas
necessidades são simplesmente satisfeitas.
Para o líder que faz carreira no setor de atendimento, é uma
constatação alarmante. Que central de atendimento não tem uma parede recoberta
de cartas e e-mails de clientes elogiando o esforço extra que alguém do
atendimento fez em seu nome? Aliás, 89 dos 100 diretores de serviço ao cliente
que ouvimos disseram que sua principal estratégia era superar expectativas.
Mas, apesar desse esforço hercúleo — e caro —, 84% dos clientes nos disseram
que sua expectativa não tinha sido superada na interação mais recente.
Uma razão para o foco na superação de expectativas é que nada menos
que 80% das organizações de atendimento ao cliente usam índices de satisfação
do cliente (ISC) como principal critério para avaliar a experiência do cliente.
E é comum o gerente supor que, quanto mais satisfeito, mais fiel o cliente
será. Mas, como outros antes de nós (sobretudo Fred Reichheld), vimos pouca
relação entre satisfação e fidelidade. Em nosso estudo, 20% dos clientes
“satisfeitos” disseram que pretendiam abandonar a empresa em questão; 28% dos
“insatisfeitos” pretendiam continuar com ela.
O retrato fica ainda mais desolador. Embora não tenha muito efeito no
aumento da fidelidade, o atendimento prestado pode contribuir muito para
miná-la (e geralmente o faz). A probabilidade de um cliente sair de uma
interação de atendimento infiel é quatro vezes maior do que a de sair fiel.
Outra maneira de pensar sobre fontes de fidelidade do cliente é
imaginar duas esferas — uma contendo coisas que geram fidelidade e outra com
coisas que geram infidelidade. A esfera da lealdade é formada basicamente de
fatias como qualidade do produto e marca; a fatia do atendimento é bem
reduzida. Já o atendimento responde pelo grosso da esfera da infidelidade.
Prestigiamos uma empresa porque seus produtos são de qualidade, a relação
custo-benefício é boa ou a marca é atraente. E, em geral, desertamos uma porque
o atendimento ao cliente deixou a desejar.
Facilite as coisas
Voltemos à principal implicação de nosso estudo: em se tratando do
atendimento, a empresa produz clientes fiéis basicamente ao ajudá-los a
resolver eventuais problemas com rapidez e facilidade. De posse desse
conhecimento, podemos alterar radicalmente a ênfase de interações de
atendimento ao cliente. Formular o desafio de atendimento em termos de
facilitar a vida do cliente pode ser altamente esclarecedor — libertador até —,
sobretudo para empresas que vêm lutando para “encantar”. Mandar o pessoal na
linha de frente superar expectativas do cliente tende a gerar confusão, perda
de tempo e esforço, além de mimos onerosos. Instruí-lo a “facilitar as coisas”
dá uma base sólida para a ação.
O que significa, exatamente,
“facilitar as coisas”? Simplesmente remover obstáculos. Identificamos várias
queixas recorrentes sobre interações de atendimento, incluindo três ligadas
especificamente ao esforço feito pelo cliente. O cliente não gosta de ter de
contatar a empresa várias vezes (ou de ser transferido) para que o problema
seja resolvido, de ter de repetir informações, de ter de pular de um canal de
serviço para outro (ter de ligar, por exemplo, depois de tentar em vão resolver
o problema pelo website). Mais da metade dos clientes que ouvimos disse topar
com dificuldades do gênero. Uma empresa pode reduzir esse tipo de esforço e
medir o efeito com um novo indicador, o Índice de Esforço do Cliente (IEC), que
usa uma escala de 1 a
5 na qual 5 representa esforço muito grande (para detalhes veja o quadro
“Índice de Esforço do Cliente”). Durante o estudo, vimos diversas
empresas que tinham conseguido implementar um modelo de baixo esforço do
cliente no atendimento. A seguir, cinco das táticas que empregaram — e que toda
empresa deveria adotar.
1. Não se limite a resolver o
problema presente — previna o seguinte. De longe, a maior causa do excesso de
esforço pelo cliente é a necessidade de ligar de volta. Muitas empresas
acreditam estar se saindo bem nesse quesito por terem um forte RPC, o índice de
resolução no primeiro contato (veja o quadro “O que medir?”). Só que 22% das
chamadas repetidas envolvem questões ligadas ao problema que motivou a chamada
original — ainda que o problema em si tenha sido devidamente solucionado da
primeira vez. Embora esteja aparelhada para prever e solucionar antecipadamente
essas questões, a empresa raramente o faz, em geral devido ao foco excessivo em
controlar a duração de chamadas.
É hora de entender que, para calcular
o esforço empreendido, o cliente computa não só como uma ligação isolada foi
abordada, mas também como a empresa administra eventos de atendimento que se
desdobram e normalmente exigem várias chamadas, como conseguir financiamento
para um imóvel ou pedir a instalação de TV a cabo. Para superar o
desafio, a Bell Canada vasculhou dados da interação de clientes com a empresa.
A ideia era entender a relação entre distintos problemas vividos pelo cliente.
Graças ao que aprendeu sobre “clusters de eventos”, a Bell passou a treinar o
pessoal do atendimento para não só resolver o principal problema do cliente,
mas também para prever e solucionar questões posteriores comuns. Uma alta
parcela dos clientes que contratavam um recurso especial, por exemplo, ligava
de volta para saber como usá-lo. Agora, o pessoal do atendimento dá uma rápida
explicação ao cliente sobre os principais aspectos do recurso antes de
desligar. Esse tipo de resolução antecipada permitiu à Bell reduzir em 16% o
total de “chamadas por evento” e em 6% a perda de clientes. Para questões
correlatas complexas, que se abordadas na primeira chamada consumiriam tempo
demais, a empresa envia e-mails — explicando, por exemplo, como interpretar a
primeira conta recebida. Agora, a Bell Canada está aplicando essa abordagem de
previsão de problemas à experiência de direcionamento de chamadas para o
cliente.
A Fidelity usa um conceito similar em
seu site de autoatendimento, sugerindo “próximos passos” ao cliente que executa
certas operações. Quando faz uma troca de endereço pela internet, o cliente
costuma ligar depois para pedir novos talões de cheque ou informações sobre
seguro residencial; logo, a Fidelity o direciona para esses tópicos antes que
saia do site. Hoje, 25% das transações de autoatendimento no site da Fidelity
têm origem em sugestões similares de “questões seguintes”; o total de ligações
por domicílio caiu 5% desde que a política entrou em vigor.
2. Prepare o pessoal para lidar com o
lado emocional da interação com o cliente. Em nosso estudo, 24% das chamadas
repetidas resultavam do descompasso emocional entre clientes e atendentes —
situações nas quais o cliente não pôs fé nas informações dadas pelo atendente,
por exemplo, ou não gostou da resposta recebida e teve a impressão de que o
funcionário estava se escondendo detrás da política geral da empresa. Com uma
orientação básica, o atendente pode eliminar muitas questões interpessoais e
reduzir, com isso, chamadas repetidas. Uma instituição britânica de
crédito imobiliário ensina o pessoal de atendimento a captar pistas sobre a
personalidade do cliente. Os atendentes rapidamente determinam se estão falando
com um tipo “controlador”, “refletido”, “emotivo” ou “artista” e adaptam sua
resposta de acordo com isso, dando ao cliente a mescla de detalhe e agilidade
adequada para a personalidade diagnosticada . Essa estratégia derrubou o total
de chamadas repetidas em impressionantes 40%.
A empresa de iluminação
Osram Sylvania vasculha o acervo de transcrições de chamadas para identificar
termos que tendem a causar reação negativa e deflagrar novas chamadas — a
palavra “não”, por exemplo — e orienta seus atendentes a refrasear a resposta.
Em vez de dizer “Não temos esse item em estoque”, um atendente poderia
explicar: “Teremos esse item em estoque em duas semanas”.
Graças a mudanças
simples como essas no discurso, a Osram Sylvania reduziu o Índice de Esforço do
Cliente de 2,8 para 2,2 — 18,5% abaixo da média que vemos para empresas B2B.
A LoyaltyOne, operadora do programa de recompensa Air Miles, ensina o
pessoal a extrair informações que ajudem a posicionar melhor um resultado
potencialmente frustrante. Se está atendendo um cliente interessado em usar
milhas para um voo não disponível e descobre que o interlocutor vai viajar para
uma reunião importante de trabalho, o atendente pode usar o fato para dar um caráter
positivo à necessidade de reserva em outro voo. Poderia dizer: “Ao que parece,
esse compromisso não permite atrasos. O voo da manhã não está disponível, mas
com a possibilidade de atraso, seria arriscado de todo modo. Sugiro um voo no
domingo à noite para não haver o risco de perda da reunião”. Com essa
estratégia, o volume de contatos repetidos caiu 11%.
3. Aumente o “stickiness” em
canais de autoatendimento para minimizar a troca de canal. Muitas empresas
perguntam “Como convencer o cliente a usar o site de autoatendimento?”. Nosso
estudo mostra que, na verdade, muitos clientes já estiveram lá: 57% das
chamadas feitas a uma central de atendimento são de clientes que foram primeiro
ao website. Embora queiram que o cliente rume para a internet, muitas empresas
relutam em fazer melhorias no site, por achar que apenas um gasto pesado e a
atualização tecnológica segurarão o cliente ali (e mesmo quando se gasta com a
modernização, a iniciativa em geral é contraproducente, pois a empresa tende a
adicionar recursos complicados e confusos para tentar acompanhar as
concorrentes). O cliente pode ficar perdido com a profusão de canais de
autoatendimento — resposta de voz interativa, websites, e-mail, chat,
comunidades de suporte online, mídias sociais como Facebook e Twitter, e assim
por diante. Além disso, em geral não está capacitado para decidir qual a melhor
opção. Se deixado à própria sorte, por exemplo, um usuário tecnologicamente
pouco sofisticado pode ir parar em comunidades de suporte online altamente
técnicas. O resultado é que o cliente pode fazer um grande esforço pulando de
um canal para outro só para apelar para o telefone no final. Hoje, a
Cisco Consumer Products direciona o cliente para o canal que, a seu ver, mais
se ajusta a ele, com base em hipóteses específicas sobre cada segmento geradas
pela equipe interna de experiência do cliente. Na página inicial do site, a
linguagem usada empurra quem entende de tecnologia para comunidades de suporte
online; quem tem menos tarimba técnica é direcionado ao banco de conhecimento
com a promessa de instruções passo a passo simples. A empresa eliminou a opção
e-mail ao constatar que não reduzia de forma inequívoca o esforço do cliente
(nosso estudo mostra que é preciso 2,4 e-mails, em média, para resolver um
problema, em comparação com 1,7 telefonema). Quando a Cisco Consumer Products
iniciou o programa, em 2006, apenas 30% do contato com o cliente se dava via
autoatendimento; hoje, o total é 84%. Já o volume de chamadas caiu.
Para reduzir o esforço do cliente, bastou à Travelocity melhorar a
seção de ajuda do website. A empresa descobrira que muita gente que buscava
soluções ali não encontrava e acabava recorrendo ao telefone. Ao eliminar
jargões, simplificar a diagramação e aumentar a legibilidade de modo geral, a
empresa fez dobrar o uso de suas “dúvidas mais frequentes” e reduziu em 5% o
volume de chamadas.
4. Use o feedback de clientes
contrariados ou com dificuldades para reduzir o esforço do cliente. Muitas
empresas pedem a opinião do cliente ao final do atendimento para medir o
desempenho interno; nem sempre, no entanto, usam os dados que coletam para
aprender com clientes insatisfeitos. Mas vejamos o que faz a National Australia
Group. A empresa tem atendentes especificamente treinados para ligar para
clientes que deram nota baixa ao atendimento. Esse pessoal se concentra
primeiro em resolver o problema do cliente, mas também busca ouvir sua opinião
e usá-la para aprimorar o serviço. O índice de resolução de problemas na
empresa subiu 31%. O aprendizado e a intervenção não estão limitados ao
canal telefone. Certas empresas monitoram o comportamento online para
identificar clientes com dificuldades. A EarthLink tem uma equipe especial de
atendentes que entram em cena conforme necessário no website de auto atendimento
— iniciando, por exemplo, um chat com um cliente que esteja há mais de 90
segundos no centro de conhecimento ou tenha clicado no link “Fale conosco”.
Esse programa derrubou em 8% o volume de chamadas.
5. Capacite a linha de frente a
proporcionar uma experiência de baixo esforço. Sistemas de incentivo que
valorizam mais a velocidade do que a qualidade podem ser a maior barreira à
redução do esforço do cliente. A maioria das organizações de serviço ao cliente
ainda enfatiza indicadores de produtividade como tempo médio de atendimento na
hora de avaliar o desempenho de atendentes. Melhor seria se abolissem índices
de produtividade que impedem que a experiência do cliente seja facilitada.
Uma empresa australiana de telecomunicações eliminou todo indicador de
produtividade do painel de desempenho do pessoal na linha de frente. Embora o
tempo de atendimento tenha subido ligeiramente, o volume de chamadas repetidas
caiu 58%. Hoje, a empresa avalia os atendentes somente com base em breves
consultas feitas diretamente a clientes, perguntando basicamente se o
atendimento que receberam satisfez suas necessidades. Livre para se
concentrar em reduzir o esforço do cliente, o pessoal do atendimento pode
facilmente marcar pontos fáceis. A Ameriprise Financial, por exemplo, pede que
seus atendentes registrem todo caso no qual são obrigados a dizer não ao
cliente. Ao fazer uma auditoria dos “nãos”, a firma descobriu várias diretrizes
obsoletas devido a mudanças regulatórias ou a melhoramentos em sistemas ou
processos. No primeiro ano de registro dos “nãos”, a Ameriprise modificou ou
eliminou 26 diretrizes. De lá para cá, ampliou o programa: pediu que o pessoal
do atendimento sugerisse outras eficiências em processos, gerando US$ 1,2
milhão em economia como resultado.
Certas empresas foram ainda mais longe, tornando o baixo esforço do
cliente a pedra angular de sua proposta de valor de serviços e branding. O
sul-africano Nedbank, por exemplo, adotou como promessa o mote “AskOnce”, o que
garante que o atendente que primeiro pega o telefone se responsabilizará pelo
problema do cliente do início ao fim.
A missão imediata é clara: o dirigente empresarial deve concentrar o
braço de atendimento em reduzir o esforço do cliente para mitigar a
infidelidade. Mas gerentes de atendimento em dúvida sobre a melhor maneira de
reestruturar as centrais de contato — departamentos erguidos sobre a premissa
de “encantar” o cliente — devem considerar o seguinte: há uma grande mudança em
curso em termos de preferências de atendimento do cliente.
Embora o grosso das empresas acredite que a esmagadora maioria dos
clientes prefere o atendimento ao vivo via telefone ao autoatendimento, nossos
dados mais recentes revelam que o cliente é, na verdade, indiferente. É um
ponto de inflexão importante, que provavelmente prenuncia o fim do atendimento
telefônico como principal canal de interação no atendimento ao cliente. Para
gerentes de atendimento empreendedores, é uma oportunidade de reformular a
organização em torno do autoatendimento e, no processo, colocar a questão da
redução do esforço do cliente de uma vez por todas no centro das atenções, onde
deveria estar.