quinta-feira, 27 de fevereiro de 2014

Um jeito mais fácil e divertido de treinar

Contar histórias faz parte da vida dos seres humanos desde a Idade da Pedra. Com elas nos envolvemos, emocionamos e aprendemos. As pessoas identificam-se com os protagonistas, torcem pelo seu sucesso e, muitas vezes, inspiram-se para atingir seus próprios alvos. Esta é uma ferramenta poderosa, capaz de difundir o conhecimento entre as gerações. E o principal motivo é o nosso cérebro: as pessoas guardam mais facilmente informações que estão dentro de um contexto e que carregam uma carga emocional. O psicólogo americano Jerome Bruner – professor de Harvard e Oxford e responsável pelo o que veio a ser chamado de Revolução Cognitiva – descobriu que um fato tem 20 vezes mais chance de ser lembrado se ele fizer parte de uma história.

Essa é uma informação muito interessante, principalmente quando relaciono ao meu dia a dia. Trabalho alguns anos com treinamentos de colaboradores e já vi muitas empresas investirem pesado em treinamentos que não trouxeram os resultados esperados. Muitas vezes as aulas são preparadas com cuidado, as informações estão bem organizadas, mas pouco tempo depois os funcionários já não se recordam do que lhes foi passado.

Este foi o desafio que resolvi enfrentar. Precisava encontrar um modo de tornar este aprendizado mais eficaz e duradouro, fazendo com que seu conteúdo continuasse fresco na mente dos funcionários mesmo com o passar dos meses. A resposta surgiu mais simples do que eu imaginava: a solução é contar uma boa história.

Atualmente quem mais entende desta arte é o cinema e a televisão. Romances, dramas, comédias, suspenses... Todas as pessoas que já assistiram um filme na vida têm seus nomes favoritos e lembram de diversos momentos da trama. O cinema tem o poder de prender nossa atenção e, com isso, gravar informações na nossa mente.

Um dos mestres nessa arte é o professor de escrita criativa Robert McKee, que dedicou mais de 30 anos ao ensino de aproximadamente 55 mil roteiristas, romancistas, documentaristas e diretores de diversos países. McKee domina os princípios de como contar uma boa história, mas alerta: “Não existe uma fórmula pronta”. Tive o prazer de participar de um de seus seminários nos Estados Unidos e posso dizer que saí de lá bastante impressionado.

As histórias mexem com o emocional das pessoas. E como trazer esta carga emocional para o mundo dos treinamentos corporativos? Um bom modo é utilizar o Storytelling, técnica que consiste em encadear os conhecimentos em formato de história para transmitir um conhecimento. Muito adotada pela publicidade, a técnica permite ensinar de um modo mais interessante, utilizando a emoção. O Storytelling parte do princípio básico de que as pessoas gostam de histórias.

Uma história serve para que as pessoas aprendam com a experiência do outro. Se cada indivíduo tivesse que aprender com sua própria experiência de vida, seria um processo lento e muitas vezes doloroso. É mais fácil ver a experiência do outro e, com isso, começar a antecipar as consequências na sua própria vida. Provavelmente uma pessoa não vai tentar uma ação que já deu errado para uma pessoa conhecida. As pessoas aprendem com as consequências de seus semelhantes.

Todos os dias novas situações nos são apresentadas e temos que, muitas vezes, dar uma resposta rápida. As pessoas não nascem sabendo como lidar com a vida ao longo dos anos. É diferente enfrentar determinada situação aos 20 e aos 60 anos, por exemplo. Todos aprendem com suas próprias vivências e também com a de pessoas próximas. Quem apresenta um histórico de experiências positivas – seja no trabalho ou na vida pessoal – acaba se tornando um padrão a ser seguido.

Relacionando estes conhecimentos com os treinamentos corporativos, é preciso criar situações que estejam relacionadas com a realidade dos colaboradores. Criar histórias que reflitam a realidade da empresa, assim o funcionário irá se reconhecer no papel do protagonista e, com isso, aprender com as consequências apresentadas.

Para introduzir o Storytelling no treinamento é preciso seguir algumas etapas: primeiro, pensar em uma metáfora, uma ambientação que possa ser dividida em episódios; segundo, pensar nos personagens, protagonistas e vilões; terceiro, criar uma estrutura que relacione os episódios, a ideia central e os tópicos do treinamento em questão; quarto, definir o desejo do personagem desde o início dos episódios; quinto, usar as consequências para mostrar como a ausência de procedimento ou o uso incorreto podem criar problemas, obstáculos ou consequências negativas para o personagem; e, finalmente, no último episódio criar uma conclusão.

Uma das principais características do Storytelling, e que garante bons resultados, é o fato de focar mais na experiência do usuário ao invés do processo. Faça o funcionário se emocionar e ele não se esquecerá do conteúdo discutido. Focar apenas em como ele deve proceder não trará os resultados esperados para a empresa, além de ser considerado quase como um castigo pelos colaboradores. Valorizando a experiência todos saem ganhando.

quarta-feira, 26 de fevereiro de 2014

Para não ficarem falando sozinhas...

"Empresas precisam perder o medo de discutir a carreira dos funcionários"

Será que as empresas estão atentas às carreiras de seus funcionários? Afinal de contas, a quem cabe cuidar delas? É comum ouvirmos que se trata de uma responsabilidade da pessoa, e não da organização, buscar as condições necessárias para sua trajetória profissional. De fato, não deixa de ser uma verdade, mas acredito que as empresas não podem ficar fora desse planejamento – caso contrário, correm o risco de ficarem fora da carreira de um talento, por exemplo.

Numa conversa recente com Rafael Souto, CEO da consultoria Produtive, especializada em outplacement e planejamento de carreira, ouvi dele a necessidade de as organizações criarem um espaço formal para discutir com seus colaboradores os rumos e os planos profissionais futuros. “Sessenta por cento dos profissionais que estão trabalhando e querem trocar de emprego dizem que lhes falta oportunidades. Isso é um dado levantado em pesquisa realizada com nossos clientes. Na verdade, falta clareza dos caminhos possíveis na empresa. Esse é o papel do líder na gestão do seu time: discutir perspectivas e apontar possíveis rumos para que a pessoas possa interagir e participar das escolhas”, diz Souto.

Falta, segundo ele, um gestor de carreira nas companhias. Trata-se de alguém capaz de manter uma conversa transparente que possa alinhar os objetivos organizacionais e pessoais. Isso porque, em muitos casos, a empresa decide, sozinha, qual o futuro de uma pessoa: “Prepare as malas porque você vai ser expatriado”. Mas será que essa pessoa quer mudar de país? É como tentar marcar um gol: cria-se as estratégias, mas sem combiná-las com os russos antes, lembrando o episódio do Garrincha. A pessoa até pode viajar, mas não dura muito tempo no cargo ou os resultados podem não ser os esperados…

E qual a mensagem que uma empresa que faz isso passa? Talvez a pior possível, pois deixa claro que se interessa apenas por aquilo que pode extrair de uma pessoa e não o que pode construir com ela. É uma espécie de extrativismo moderno, em meio a discursos de ética, colaboração e busca pelo bem-estar geral das pessoas que compõem uma organização.

O.k., muitas empresas possuem programas de planejamento de carreira, mas sempre é válido questionar até que ponto eles não reproduzem esse paradigma e acabam vendendo um interesse particular como de consenso. Será que é difícil ouvir o que as pessoas querem? Será difícil repensar os contratos com o colaborador? Seria uma tarefa impossível pensar em alternativas de carreira?

Esse é outro ponto: como criar um caminho no qual o funcionário possa se sentir realizado, aprendendo, produzindo e (por que não?) ganhando mais – ou recebendo algo que o gratifique (mais trabalho e mais responsabilidade pressupõem mais reconhecimento e uma recompensa)? Que outras formas de carreira as empresas podem oferecer para seus colaboradores em tempos de quadros enxutos?

Se essa conversa não acontecer, muitas companhias acabarão, um dia e talvez em breve, falando sozinhas, feito loucas, atrás dos talentos que perderam. Pense nisso!

terça-feira, 25 de fevereiro de 2014

Hábitos daqueles que aprendem mais rápido

“A habilidade de aprender mais rápido que outros é provavelmente a única vantagem competitiva realmente sustentável”. A frase, do executivo e teórico holandês Arie de Geus, resume a importância de saber aprender - habilidade cada vez mais valorizada em tempos de avalanche de informações e de surgimento (minuto a minuto) de novas tecnologias e ferramentas.

Essencial para quem deseja chegar ao topo da carreira e se manter nele, a habilidade de aprender é o tema do livro de Fernando Jucá “Expertise em Aprender”.
Como o autor escreve, “profissionais que sabem aprender fazem carreiras mais dinâmicas, ricas e muito mais prazerosas”. São essas as pessoas que conseguem chegam aos mais altos cargos corporativos.

Sócio da consultoria Atingire, Jucá conta que há algum tempo algo o incomodava. É que por mais bem feitos que fossem, muitos programas de treinamento corporativo não davam o resultado esperado.

“O aprendizado só acontece se houver um aprendiz”, diz ele, que decidiu se aprofundar no estudo do desenvolvimento desta capacidade.
“Pedimos para que as pessoas apontassem os profissionais com a expertise em aprender e fomos investigar o que eles faziam de diferente dos outros”, diz.

O resultado foi a elaboração de um modelo de ação geralmente adotado por quem se destaca no que diz respeito ao aprendizado. E esse modelo é o grande segredo dos melhores profissionais, segundo Jucá. Confira o que eles fazem de diferente dos outros:

1 Humildade e objetivos

“O ser humano mantém a si mesmo pela renovação, pelo aprendizado constante”, escreve Jucá. O primeiro passo que diferencia as pessoas que aprendem mais rápido das outras é reconhecer as oportunidades de aprendizado. Além disso, elas traçam objetivos específicos de desenvolvimento pessoal, explica o autor.
As pessoas que aprendem mais rápido do que as outras têm a humildade necessária para aprender o que não sabem e também para reaprender ( sob nova ótica) aquilo de que já sabem.

Ou seja, estão sempre revendo conceitos e convicções. E traçam metas para isso. “Objetivos desafiadores são poderosos instrumentos de engajamento”, escreve Jucá.
Quem tem essa primeira dimensão do aprendizado mais bem desenvolvida são os profissionais com “expertise em energizar”, classifica Jucá. Pesquisa, realizada com 250 executivos de grandes empresas na cidade de São Paulo, apontou que 25% são deste perfil.

2 Procura por novas experiências

Os executivos que são experts em aprender são extremamente abertos e proativos em relação a diferentes tipos de experiências, segundo Jucá.
Buscam diferentes tipos de desafios em suas carreiras, pesquisam, discutem e questionam pessoas a sua volta. Essa habilidade se sobressai em profissionais classificados por Jucá como experts em explorar. Na pesquisa realizada pela Atingire, 31% dos participantes tinham essa capacidade mais desenvolvida.

3 Pensamento crítico

Além de buscar novas experiências, o experts em aprender são capazes de refletir acerca delas, extraindo princípios gerais e fazendo novas conexões.
São aquelas pessoas que sabem fazer as perguntas certas. Em outras palavras, interagem com o que aprendem.

Ter essa habilidade desenvolvida é ter o que Jucá chama de “expertise mental”. Na pesquisa realizada pela sua consultoria, a Atingire, 24% dos participantes tinham essa característica desenvolvida.

4 Mudança de comportamento

Consolidar o aprendizado a partir da prática é a quarta dimensão que diferencia os experts em aprender, que como explica Jucá são protagonistas do seu desenvolvimento.
Traduzir em ação o resultado dos outros 3 itens é parte fundamental do modelo de aprendizado proposto no livro. E esta é parte menos desenvolvida da expertise em aprender nos executivos. A pesquisa da Atingire mostra que apenas 20% dos entrevistados tinham este perfil.

Como explica Jucá, quem tem esta habilidade, sabe que “o aprendizado só se concretiza quando origina novos comportamentos positivos”.

Por que as coisas são como são?

Tenho, nos últimos 10 anos, mergulhado na alma das organizações. São empresas grandes, multinacionais, públicas, pequenas ou organizações sociais. Graças ao modelo de pesquisa – Offplan – pude aprender muito, já que sentimentos verdadeiros dos que trabalham nas organizações emergem com facilidade. Nessas andanças ouvi até Eduardo Coutinho (ele trabalhou numa ONG), ele que ouvia e ouvia, construindo sua arte através das pessoas. 

Muito poucas pessoas têm interesse verdadeiro na escuta. Cada vez mais cada um de nós parece estar preso dentro de si, mesmo que nossos polegares passeiem pelos fabulosos instrumentos tecnológicos. As pessoas presas às máquinas estão distantes, falamos o que queremos, quando queremos, e só lemos com atenção seletiva as mensagens que circulam incessantemente. Só o fato de ter vontade de ouvir, de anotar, libera o que está às vezes mais escondido, até de nossa consciência. É fácil fechar meus olhos e me lembrar de frases, expressões, desenhos que deixam claro que a felicidade é rara, para a maioria, no mundo do trabalho. Já escrevi um artigo no passado onde me perguntava: Por que o trabalho tem que produzir dor? Na maioria das vezes essa dor não é consequência de baixos salários ou falta de benefícios. 

Na maioria das vezes essa dor é produzida por um modelo de gestão autoritário, na falta de comunicação interna transparente e na quase absoluta falta de comunicação face a face. O que impressiona é que nesses anos dourados do nosso século a maioria das empresas escreveu missão, visão e valores. A Responsabilidade Social, o meio ambiente, o conceito de stakeholders, a sustentabilidade passaram a fazer parte dos fazeres da empresa, multiplicaram-se os balanços sociais e depois relatórios, mais completos, como o Global Report Iniciative. Mas as organizações parecem sofrer de uma espécie de esquizofrenia. Fala-se, mas atuar de forma diferente, ainda caminha a lentos passos. 

A cultura autoritária e hierárquica de nosso País continua a influenciar a realidade. Temos baixíssima capacidade para uma liderança compartilhada e uma enorme dificuldade de aprender a ter uma visão sistêmica. Quando pensamos nos nossos municípios, nas organizações públicas em geral, nas relações dos moradores das cidades com seus dirigentes, essa falta de escuta mostra o quanto poucos escolhem como vivemos. 

Trabalhar para alcançar a sustentabilidade exige, acima de tudo, mudar nosso modelo mental. Somos um País onde a maioria fica distante do poder em qualquer instituição ou organização, um País extremamente desigual. Isso gera dor para a maioria. O autoritarismo e o medo combatem hoje a autonomia que a tecnologia nos traz. Crise. Uma profunda crise ética. Isso afeta por dentro as organizações, mas também as vendas, o pós venda, o marketing de todas elas. Uma sensação de viver um mundo de mentira, a desconexão entre o que se prega e como se age. Os americanos falam em walk the talk. 

Isso virou o padrão normal da liderança, inclusive na política. Assistindo TV, os telejornais e os comerciais, fingimos acreditar no que sabemos ser diferente. Como vamos sair desse paradigma mental? Não existe ética sem escolhas e sem renúncia. A empresa, que quer de fato ser sustentável e oferecer felicidade a seus stakeholders, precisa respeitar a vida, de verdade. Lá estão os valores escritos, atrás dos cartões de visita, dos crachás, nos banners, publicados em maravilhosas peças criativas, sem falar nas peças publicitárias. Mas quando ouvimos os colaboradores, as comunidades, muitas vezes encontramos uma realidade muito diferente. 

Cada vez mais a comunicação ocupará um lugar desafiante, precisamos sair do velho modelo que nos impunha manter o silêncio na base e caminhar para transformar consciências em direção às novas atitudes: ouvir as bases. Inclusive nas cidades. A potência das organizações está nos seus relacionamentos, no compromisso com todos aqueles que fazem parte do negócio, mesmo que não tenha sequer uma ação da empresa na bolsa de valores.

quinta-feira, 20 de fevereiro de 2014

#Bermuda Sim

As altas temperaturas registradas no sul e sudeste reacenderam a polêmica do uso de bermuda em ambientes de trabalho. Algumas empresas já aderiram à liberação.

O maçarico está aberto e esqueceram de desligá-lo na região sul e sudeste do Brasil. Essa é a percepção que moradores dessas regiões têm desde o inicio do ano. Isso porque as temperaturas registradas nesse período estão acima dos 30ºC, com sensação térmica ultrapassando os 50ºC, e aquela chuvinha do verão resolveu não dar as caras em 2014. Nesse cenário, o clima esquenta para todos os lados. Para evitar o bate-boca sobre o tema e a baixa produtividade no trabalho, algumas empresas resolveram flexibillizar as regras de dress code  e liberaram a bermuda. 

Na Radix, empresa de engenharia e de softwares, a liberação da bermuda vai se estender durante todo o período de maior calor. Em outras palavras, até o Carnaval.  A ideia da liberação partiu dos próprios funcionários que foram conversar com a diretoria sobre o assunto. A direção atendeu ao pedido dos colaboradores, mas com certas ponderações. Usar a bermuda com consciência é uma delas. “Shorts não é bermuda”, indica a diretoria. Ter uma calça sempre à mão, caso surja uma reunião de última hora, é outra sugestão da direção.  

A empresa de tecnologia para recrutamento, a Catho, também aderiu ao movimento Bermuda Sim.  “A Catho não tem uma cultura de uso de roupas formais, o jeans e camisas polo já fazem parte do dress code, sendo assim, era natural deixarmos nossos colaboradores mais à vontade em dias de 37 graus”, informa Angélica Nogueira, gerente de RH da Catho. Claro, a exemplo da Radix, a liberação vem com certa moderação. "Nada de bermuda de times, calção ou traje de surf. Decretamos a mesma lógica do movimento #BermudaSim: se mais de duas pessoas implicarem com a bermuda, é porque ela é inadequada",  reforça Angélica. 

O movimento mencionado por Angélica “Bermuda Sim” é fruto de uma manifestação criado por três colegas cariocas que se perguntavam: moramos num país tropical porque as pessoas são obrigadas a trabalhar de calça? Do questionamento, surgiu a campanha #Bermuda Sim. Com humor, o movimento mostra que a produtividade não está conectada ao tipo de roupa escolhida pelo colaborador, desde que este não ultrapasse os limites do bom senso, descritos nos mandamentos do grupo, os Bermudamentos (sugestão, colocar o box com os Bermudamentos). 

Os colaboradores do Hotel Urbano, agência de viagens on-line, já decoraram as regras do Bermudamentos. Por lá,  a bermuda é rotina e foi liberada desde a criação da empresa, em janeiro de 2011. “O uso da bermuda não atrapalha em nada no rendimento profissional, pelo contrário, serve de incentivo nos dias de calor”, afirma João Ricardo Mendes, cofundador do Hotel Urbano. “Vendemos qualidade de vida e é essencial que ela faça parte do dia-a-dia da nossa equipe”, ressalta.

E no Hotel Urbano não existe essa de estação, mesmo no inverno os funcionários da agência podem usar o dress code despojado.  A empresa de desenvolvimento de softwares de gestão TOTVs também resolveu investir na ideia. Ela acaba de modificar seu código de vestimenta para alinhá-lo ao conceito da nova marca: o novo jeito de se vestir da companhia é mais simples e mais conectado à nova geração. E isso inclui o uso da bermuda de sarja ou jeans e a extinção do casual day. "Antes toda sexta-feira era casual. No entanto, começamos a nos perguntar por que podíamos usar algo mais despojado em apenas um dia da semana", explica Cristiano Brasil, diretor de Recursos Humanos da TOTVS.

Além disso, a companhia liberou o uso de camisetas polo, legging, rasteirinhas, sneakers e tênis neutros, como sapatênis e All Star para todos os colaboradores. "A mudança de marca trouxe novos direcionamentos e o jeito de vestir TOTVS é reflexo dessa identidade", diz Alexandre Mafra, vice-presidente executivo e financeiro e de Relações Humanas da TOTVS.

Mandamentos do grupo Bermuda Sim

1. Bermuda só a partir dos 29,8°C.
2. Tamanho da bermuda: 3 dedos acima ou abaixo do joelho.
3. Short de surfe não é bermuda.
4. Uniforme de time não é bermuda.
5. Samba-canção... ah toma vergonha!
6. É proibido usar floral.
7. Dia de reunião, nada de bermuda.
8. Não é porque está de bermuda que pode usar regata.
9. Se mais de 2 pessoas zoaram sua bermuda, é porque ela não é apropriada.
10. Não repetir a bermuda mais de 2 vezes na semana.

quarta-feira, 19 de fevereiro de 2014

Forças em comum

Tabu em algumas empresas, prática comum em outras, a competição interna pode ajudar a descobrir talentos e levar melhores resultados para a organização - desde que alguns fatores sejam observados.

Faz parte da natureza humana o gosto pela disputa e não há como negar que as empresas são ambientes cada vez mais competitivos. Um estudo publicado recentemente pela psicóloga Betânia Tanure, da Fundação Dom Cabral (FDC), de Minas Gerais, aponta que os executivos paulistas são os mais individualistas, competitivos e menos preocupados com relacionamentos, ou seja, olham mais para suas próprias carreiras do que para as suas equipes.

As estatísticas mostram que quase um terço do tempo no trabalho é gasto com a administração de conflitos, mas, como bem disse o ex-presidente norte-americano John Kennedy, "é nos momentos de crise que eu tenho as minhas melhores idéias". Estaria aí a solução para tornar a competição interna e a administração de conflitos entre colaboradores e equipes um dado positivo para o desenvolvimento profissional?

Para o mestre em Administração de Empresas da Fundação Getúlio Vargas (FGV) e autor do livro Ética na gestão de pessoas: uma visão prática, Flávio Farah, "os sistemas competitivos são incompatíveis com o trabalho em equipe, já que a competição interna destrói a cooperação e estimula os atos imorais como a sonegação de informações, a recusa de ajuda a colegas de trabalho e até a sabotagem do trabalho alheio". 
Além disso, continua Farah, ela inibe a aprendizagem e a criatividade, já que as pessoas envolvidas em uma disputa concentram fortemente sua atenção nas concorrentes e em suas reações e, assim, não têm tempo para aprender nem para imaginar novas maneiras de fazer as coisas.

Um exemplo típico de uma competição interna predadora está no filme O Sucesso a Qualquer Preço, de 1992, no qual os atores Al Pacino, Jack Lemmon, Ed Harris e Alan Arkin vivem quatro corretores de uma imobiliária de Chicago, cujo gestor, interpretado por Alec Baldwin, estabelece um concurso de vendas em que o primeiro colocado ganha um prêmio dos sonhos: um automóvel Cadillac Eldorado. Já para o segundo colocado, o prêmio estabelecido é um simples jogo de facas de churrasco e, para os outros, a rua, porque como define o gestor, "nesta empresa não há lugar para fracassados".

Guardadas as devidas proporções, as psicólogas e executivas Ângela Sardelli e Celina Beatriz Gazeti viveram uma situação parecida anos atrás quando, juntas com outra profissional, concorreram a uma vaga de gerente para uma divisão da empresa em que atuavam. "Eu e a Celina já éramos muito amigas e foi um processo muito sofrido na época porque o nosso gestor teve um papel totalmente errôneo. Eram feitas entrevistas individuais com as três e nelas havia um incitamento claro à competição e nós nos sentíamos manipuladas", lembra. Segundo ela, o papel correto de um gestor em uma situação dessas é o de ter maturidade e valores éticos pessoais para saber articular situações e propiciar recursos para que os seus comandados busquem melhores resultados. "Mas sem nunca partir para a manipulação e estimular o individualismo", explica Ângela, que hoje é sócia de Celina na Vox Solutions, uma das quatro empresas que faz parte da joint venture Cliv Solution Group. 

Falando em ética, para o professor Flávio Farah, do ponto de vista ético, a fixação de metas para os colaboradores nas empresas torna-se questionável quando, para o seu cumprimento, aqueles que ocupam posições de liderança na empresa estimulam o vale-tudo com exortações do tipo: "Cumpra suas metas, não importa como"; "Consiga aquele contrato de qualquer maneira"; "Faça o que for preciso para manter esse projeto dentro do orçamento". "Ordens como essas sinalizam aos colaboradores que, para atingir objetivos, quaisquer estratégias são válidas, inclusive as que incluem o uso de meios imorais ou ilegais", diz.

"A partir das histórias isoladas de indivíduos que realizaram coisas que pareciam impossíveis, firmou-se a crença de que o ser humano tudo pode, de que não existem limites para o homem. Essa crença, porém, não passa de um mito, pois, até hoje, ninguém foi capaz de demonstrar logicamente que, para o ser humano, tudo é possível", argumenta Farah, que acrescenta: "Como as empresas têm o costume de fixar metas novas e mais difíceis depois que as anteriores foram cumpridas, os colaboradores enfrentam a cada momento, e sob ameaça de demissão, novos desafios cuja superação é incerta."

Competição interna não é pecado

Para a psicóloga e diretora geral da IDH - Instrumentos de Desenvolvimento Humano, Adriana Fellipelli, "a competição interna existe sim na maior parte das empresas e é bem forte, até porque o ser humano é um ser político e nas corporações, como no nosso País, só é possível governar ou realizar alguma coisa em cima de coalizões, de negociações". Mas o tema ainda é um tabu em várias empresas. "Alguns gestores têm receio de falar sobre o assunto como se fosse um pecado ter competição interna. O ruim é mascarar que ela não existe. Não há nada demais em competir, desde que sejam mantidos os valores éticos, o equilíbrio.
Estimular a competição pode até ser uma boa estratégia desde que sejam claros os limites e as conseqüências dessa prática para os gestores e os seus subordinados."

Adriana também destaca a importância da comunicação nesse processo: "Ela tem de ser clara e objetiva e deve atingir todos os envolvidos. Tem muita gente que não consegue fazer o marketing do que está construindo e isso é da natureza dessas pessoas, então o gestor precisa ter muita atenção para não prejudicá-las no processo. Hoje, em todos os setores, vivemos a guerra da atenção, ou seja, de alguma maneira precisamos chamar a atenção para o que estamos realizando".

Pelas leis do mercado corporativo, a competição entre as empresas é sempre saudável e resulta em ganhos financeiros e de qualidade para o consumidor, mas quando ela ocorre no âmbito interno dessas empresas, aí as coisas se complicam e a controvérsia aparece. Uma definição de Bill Gates aumenta ainda mais a polêmica: "Se houver dois profissionais iguais é porque um está sobrando".

"Quando as regras não são claras ou quando a comunicação ou o estilo do gestor não é o correto, esse processo de competição está fadado a ter pouco resultado efetivo e aí podem aparecer subterfúgios como a sabotagem, por exemplo", explica Fernando Cardoso, sócio-diretor da Integração Escola de Negócios. 

Para o executivo, acostumado a trabalhar com a gestão pelo grupo e com dinâmicas colaborativas e descentralizadas, um dos maiores problemas é quando o líder ou gestor do grupo não permite que ninguém cresça do lado dele. "Aí ele acaba amarrando, engessando todo o grupo, e nivela toda a empresa nele. É muito difícil quando o líder trabalha só na defesa e não no ataque. É como se ele agisse apenas no seu território e não na empresa", diz.

Fernando defende a máxima de que toda equipe é o espelho do seu líder e por isso ele não pode agredir, ele tem de ser político e envolver todas as pessoas no seu projeto. "Isso elimina muito a competição e os conflitos." E essa política envolve inclusive, segundo Cardoso, a comunicação para o grupo. Em vez de dizer "Não falei que isso aqui era ruim?" quando as coisas não vão bem entre os colaboradores, não é mais fácil e tem melhor resultado usar uma expressão como "muda aqui, Fulano, e você vai ver como fica melhor"?

As companhias que hoje estimulam a competição sem levar em consideração o relacionamento entre seus colaboradores das mais diversas áreas pensam apenas no curto prazo e não vêm a sustentabilidade como um valor. Já aquelas nas quais as pessoas são pouco competitivas também vivem uma situação estranha porque a tendência é que todos comecem a trabalhar naquela terrível zona de conforto. Mas como é que um líder consegue ter gente competitiva sem deixar o ambiente insuportável? Parece que só há uma solução: determinar claramente como vai ser a competição na equipe.

Todos concordam que o ponto-chave dessa história é o sistema de gestão de carreira, que precisa ser muito bem formatado. Há, ainda, um outro ponto que gera muita polêmica: ao estimular a competição interna, as empresas precisam considerar que a sua pirâmide organizacional tem, como em todo triângulo, muito menos espaço no seu topo do que na sua base, o que significa claramente que nem todos aqueles que lutam para chegar no topo vão encontrar espaço para atuar.

Ambientes harmoniosos

Especializada em pesquisas de clima organizacional, a consultoria Hay Group tem identificado, cada vez mais, que ambientes profissionais mais harmoniosos tornam-se diferenciais importantes nas empresas para o engajamento e comprometimento das pessoas nos projetos e nos resultados. "Nas corporações que definimos como as 30 melhores empresas para se trabalhar no país, em 63% delas as áreas estão integradas entre si; já para 68%, o espírito interno de equipe é alto; na questão de divisão de idéias e de tecnologia, o índice chega a 76% e quando perguntamos para os profissionais se a equipe recebe apoio de alta qualidade, esse índice bate nos 68%, chegando a 83% quando a questão é se existe boa cooperação de equipe e trabalho no grupo do entrevistado", expõe Luiz Carlos Zanolli, consultor do Hay Group.

Os números reforçam a crença de que o melhor ambiente profissional leva aos melhores resultados porque há uma relação de troca e os colaboradores enxergam perspectivas positivas e plausíveis na carreira e a possibilidade de se expressar, falar e ser ouvido naturalmente. Para Zanolli, "é inevitável fugir da competição interna porque o mundo moderno nos ensina isso a todo instante, mas é absolutamente necessário que esse processo tenha regras claras e muito bem definidas, tanto quantitativa como, principalmente, qualitativamente".

As pesquisas do Hay Group também apontam para uma mudança interessante: a competição interna bem estruturada tem possibilitado que surjam profissionais mais qualificados e preocupados com o seu autodesenvolvimento, enquanto as empresas têm investido mais na construção de ambientes estimulantes ao investimento nas carreiras, nos profissionais e em projetos que provoquem e surpreendam o mercado.

Incentivar de forma saudável

Na ADT Security Services, a competição interna é incentivada e vista como uma ferramenta normal para alcançar resultados para ambos os lados. "As áreas que mais estimulam a competição na nossa empresa são as de vendas e operações. Pela cultura, em vendas é absolutamente normal que essa competição aconteça. 

No departamento de operações, composto pelo atendimento ao cliente, monitoramento, fidelização, retenção, manutenção e instalação são analisados o desempenho individual de cada colaborador e também o resultado final, ou seja, o resultado do departamento é o objetivo final e este tem de ser realizado ou não existem vencedores", explica Patrick Kraus, gerente de operações da ADT Brasil.

Para Marcelo Haddad, gerente-geral da ADT Brasil, um time de alta performance é aquele em que cada um sabe como foi o seu resultado no mês e como ele contribuiu para o resultado final da empresa. "É possível incentivar a competição interna de forma saudável. No nosso modelo, os resultados de diversos meses de competições reforçam as nossas promoções e eles também são utilizados para identificar potenciais talentos dentro das áreas", observa. Haddad cita, inclusive, um caso real e recente que ilustra o modelo utilizado pela empresa: "Em uma campanha de vendas de serviços, identificamos um potencial talento e a partir disso criamos uma área de telemarketing com a aprovação de todos os colaboradores que estavam envolvidos na campanha". Incentivo e humildade em ensinar e aprender são duas outras características decisivas, segundo o executivo, para que um colaborador alcance uma promoção na companhia dentro desse modelo.

Um estudo realizado pelo grupo norte-americano de pesquisa independente The Pew Research Center mostra que para uma nova geração de profissionais - aqueles que pensam em ganhar muito dinheiro e sonham com uma carreira estável -, a competição contribui para a superação e é o motor que estimula para se alcançar metas; no entanto, se exagerada, pode afundar uma carreira potencialmente brilhante.

A política da meritocracia

Pedro Almeida, diretor de gente e de relações corporativas da América Latina Logística (ALL), dona da maior malha ferroviária do Brasil, é um defensor da competição interna normatizada e de um modelo que utiliza a política da meritocracia (o reconhecimento por resultados). "Na nossa empresa temos um modelo muito claro que balanceia bem a competição com a confiança de todos os envolvidos nela", diz. O programa amplo de metas da corporação está aliado a um programa de recompensas variáveis e envolve desde o presidente ao auxiliar de produção, passando, inclusive, pelos maquinistas e motoristas, que são um número expressivo no universo de 4,2 mil colaboradores.

"Não dá para ter um modelo socialista e nem existe um que agrade a todos os colaboradores nos mais diferentes níveis, mas a minha experiência de muitos anos mostra que o modelo no qual as pessoas que fazem mais ganham mais, ainda é o mais saudável", define Almeida, que também destaca outras ferramentas importantes pelas quais a área de Recursos Humanos pode administrar de maneira mais correta a competição interna: "Não podemos deixar que apenas os números definam o desempenho dos colaboradores e das equipes. Por isso, é muito importante utilizarmos ferramentas qualitativas, como a avaliação 360º, que valoriza como competência o bom relacionamento com os outros, o resultado positivo da equipe". 

A proposta do modelo meritocrático é a de reconhecer os funcionários por seus méritos e beneficiá-los a partir de suas ações. A meritocracia é mais uma ferramenta para os gestores, na qual os colaboradores são alinhados aos objetivos da companhia, de forma que todos trabalham com um só foco e objetivo: trazer resultados positivos para as duas partes.

"A meritocracia oferece benefícios inegáveis. Por princípio, em uma empresa que a adota, toda a cultura interna precisa confirmar que a posição do colaborador é resultado das suas realizações individuais. Em geral, isso resulta em uma ênfase na educação formal, no talento e na competência de cada um", explica a diretora de capital humano da Sky, Roseli Parrella.

Outro aspecto importante desse sistema é a avaliação. Ao responsabilizar cada colaborador pelos resultados, a meritocracia exige cobrança e mensuração. "Assim, a avaliação passa a ser contínua e permanente e isso contribui para a evolução tanto da empresa quanto do profissional", acrescenta Roseli, que define que o ambiente de trabalho na Sky é de extrema cooperação e não dá espaço para a acomodação.

Para os gestores que optaram pelo modelo meritocrático e deixaram de lado as culturas de favorecimentos, a recompensa pelos méritos vem, na maioria dos casos, em forma de remunerações variáveis e prêmios, além de um plano de carreira traçado para cada profissional. Em todo o mundo corporativo, a visão é que os EUA, com a sua política de mais produtividade, maiores oportunidades e motivação para os estudantes e profissionais se dedicarem às suas  escolhas, são o melhor exemplo a ser seguido.

Seja por meio da competição interna, da meritocracia ou de qualquer outro modelo que venha a ser adotado, é muito importante que os líderes não se esqueçam de que eles devem ser os protagonistas dessa história e que a área de Recursos Humanos e seus gestores sejam os guardiões dessa cultura.
Itens na agenda

Alguns cuidados na hora de pensar em gerar a competitividade entre os colaboradores:

- Sobre metas: não adianta tentar abraçar o mundo, os objetivos devem ser traçados de modo que sejam desafiadores, mas não impossíveis. Além disso, é preciso prestar atenção ao modo como essas metas são alcançadas. Em tempos de governança corporativa, não basta o quanto, mas o como também tem um peso maior para a construção da imagem de uma empresa.

- Muita atenção aos líderes e gestores. Eles têm um papel importante em prover os recursos necessários para que os colaboradores consigam atingir as metas estabelecidas e, também, para mediar possíveis conflitos entre áreas.

- E por falar em imagem, deve-se levar em consideração, no que se refere à competição entre colaboradores, o fator sustentabilidade. Ou seja: é preciso pensar no longo prazo e deixar a disputa interna correr sem freios pode abreviar a vida de uma área ou companhia.

- Ter uma comunicação clara e objetiva é um bom remédio para muitos dos males corporativos - inclusive para questões de competitividade interna.

- Tudo o que é feito em acordo não sai caro para as duas partes e o mesmo se dá na empresa que deseja estimular a competição entre seus funcionários. Estabelecer regras claras de como será o jogo é um passo importante para bons resultados.

- Para ajudar nesse processo, o bom uso de algumas ferramentas e políticas de gestão de pessoas contam e muito. Ter um planejamento de carreira bem estruturado, por exemplo, é um dos itens que devem constar na agenda. Outro componente de destaque é a meritocracia: saber reconhecer cada um naquilo em que contribui.


terça-feira, 18 de fevereiro de 2014

Violência moral no trabalho

Há cinco anos, Fernanda (nome fictício), era estagiária numa empresa de informática na capital paulista. Recebia elogios e tinha um bom relacionamento com sua chefe, que dizia admirar seu trabalho, seu esforço e sua força de vontade. Mas esse clima de admiração e de cordialidade não durou muito. O relacionamento agradável desmoronou assim que Fernanda foi efetivada.

Ela passou, então, a ser tratada aos gritos, recebia inúmeras reclamações e insultos. "Minha chefe só me chamava aos berros e todos paravam para ouvir. Nas reuniões de trabalho, ela dizia diante dos meus colegas que eu não sabia fazer nada direito e que eu não era exemplo para ninguém. Eu era chamada de burra e escutava que aquele lugar não era para mim. Por muitas vezes fui chamada em sua sala e era agredida verbalmente. Saía chorando e sem reação, até que, em oito meses, fui dispensada", desabafa 
Fernanda, que preferiu não processar a empresa, nem a agressora.

Fernanda é uma dos milhares de brasileiros que sofrem silenciosamente um mal que teima em assombrar muitas empresas em plena era de pesquisas sobre melhores lugares para trabalhar: o assédio moral. A impressão que fica é que por mais que se fale em manter um excelente clima organizacional, trabalho em equipe, respeito à diversidade e tantos outros aspectos de gestão de pessoas que primam pelo bom relacionamento interpessoal na empresa, esse problema ainda persiste de forma assustadora. 

Para alguns, o assédio pode significar aquela motivação extra para se conseguir alcançar uma meta mais ousada (mas constitui um ato lesivo ao trabalhador da mesma forma) - o que poderia caracterizar o desconhecimento de muitos gestores sobre o tema. O que não é pouco provável, se pegarmos os resultados de uma pesquisa feita pela Universidade de Brasília (UnB) junto a gestores de uma instituição financeira do setor público.

Como diz Antônio Martiningo Filho, responsável pelo estudo da UnB, a definição sobre o conceito de abuso no ambiente de trabalho não está clara para quem manda. Em outras palavras: não são todos os chefes que sabem o que é assédio moral e como ele se manifesta. Ou seja, caímos na visão de que forçar um pouco a barra é uma forma de impulsionar o funcionário... Para evitar os dissabores de problemas dessa natureza, uma das melhores saídas é investir em comunicação.
"Todo relacionamento, seja ele comercial ou pessoal, deve ser pautado pela comunicação. A empresa age preventivamente quando deixa claras quais são as regras e normas de conduta esperadas", diz Sandra 

Maura, diretora da Topmind, empresa que atua nos segmentos de tecnologia da informação e telecomunicações. Segundo a executiva, quando os funcionários têm consciência de que a organização é contra esse tipo de prática, a exposição às situações humilhantes ou constrangedoras seguramente é minimizada. Em alguns casos, uma cartilha pode resolver (ou minimizar) quaisquer desentendimentos e falhas de conduta entre colaboradores e prestadores de serviço.

Outra iniciativa a ser levada em conta, por parte das empresas para evitar esse tipo de problema, é investir no treinamento e na conscientização de seus colaboradores e gestores para que todos possam identificar claramente as situações de assédio moral e repudiar a sua prática, conforme relata o pesquisador da UnB. 

Ao analisar as respostas dos gestores entrevistados, Martiningo percebeu que, apesar de terem alguma noção, a definição de assédio moral não era clara. "O assédio moral caracteriza-se pela intenção de prejudicar e pela repetição. São ações discriminatórias dirigidas a uma pessoa específica com o intuito de separá-la do grupo, e podem acontecer de várias maneiras", explica o pesquisador.

Em termos jurídicos, segundo o advogado Gilberto Costa, do escritório Macedo & Costa Advogados, o assédio moral é entendido como uma perseguição freqüente e sistemática ao empregado, que vai além das provocações no ambiente de trabalho. Trata-se de uma conduta reiterada do empregador, superior hierárquico, ou até mesmo de funcionários de uma mesma condição hierárquica, que representa uma perseguição contra determinada pessoa.

Quer exemplos? Humilhações, constrangimentos, menosprezo por meio de condutas abusivas (gestos, palavras e comportamentos), exclusão, além de metas impossíveis de cumprir, críticas públicas que visam desmoralizar o colaborador e ofensas motivadas por sua condição física ou orientação sexual são alguns - desde que sejam realizados com freqüência.

Já os motivos para o assédio normalmente estão ligados a fatores que vão desde a existência de preconceitos com relação à cor, sexo, religião e até obesidade. "Em muitos casos, quem assedia são pessoas que questionam a forma de trabalho e que, por vezes, são consideradas 'menos produtivas', ou ainda, pessoas muito preparadas para o cargo e que de alguma forma ameaçam as possibilidades de ascensão de componentes do grupo e até a posição de chefia", explica Martiningo.

Margarida Barreto, médica do trabalho e mestre em psicologia social da Rede Nacional de Combate ao Assédio Moral no Trabalho, acrescenta que, normalmente, os assediadores são pessoas autoritárias que encontram, no trabalho, o meio propício para  exercer a tirania e comandar os trabalhadores como se estivessem em um campo de  batalha. "Outros escondem sua insegurança, imaturidade e instabilidade emocional com o uso sistemático da mão de ferro, tiranizando a todos e exigindo que estejam implicados com a produção, com a meta estipulada", diz.

Ela explica que as pessoas que sofrem assédio moral, inicialmente, começam a duvidar de si, da sua capacidade profissional e tentam mostrar que são capazes, entregando-se mais e mais ao trabalho. À medida que o tempo passa, sentem-se tristes, angustiadas, ansiosas, instáveis e se isolam. Além disso, negam que estão sofrendo agressão e evitam afastar-se do trabalho, apesar do clima de ameaças e da manipulação pelo medo. Com o passar do tempo, começam a sofrer de insônia, têm pesadelos, pensamentos repetitivos e recorrentes, passam a apresentar sinais de gastrites, hipertensão arterial, estresse, cefaléias, falta de apetite ou passam a comer mais que o normal.

Assédio moral X bullying 

Assim como o assédio moral, muitos gestores não sabem identificar o bullying, também caracterizado por atitudes agressivas, intencionais e repetidas, que ocorrem sem motivação evidente, e que são executadas dentro de uma relação desigual de poder. "Ambas envolvem a contínua ridicularização do outro e há a cumplicidade do grupo no qual o profissional está inserido. Contudo, os processos de bullying podem ir além dos insultos verbais e chegar às agressões físicas", explica Sandra Maura, da Topmind.

Para evitar esse tipo de problema ou essas práticas, o profissional de RH deve ter uma visão objetiva do perfil psicológico dos empregados em posição de comando em todos os níveis. "Na maioria das vezes, o 'terror psicológico', o assédio em si, parte de posições de comando, posições hierárquicas superiores, podendo ser difundidas aos colegas de trabalho de mesma posição hierárquica, que passam a adotar a mesma conduta em face do ofendido", explica Gilberto Costa.

Para a diretora da Topmind, o gestor precisa ser o exemplo das melhores práticas esperadas. "Jamais deve partir dele atitudes que exponham membros de sua equipe a uma situação de constrangimento. Caso detecte que isso ocorre entre os seus colaboradores, a melhor estratégia da empresa é não deixar que a situação fique ainda pior e não deve permitir que a mesma perdure", acrescenta o advogado, destacando que falar com envolvidos e comunicar à equipe que a prática não é permitida e que só traz prejuízos (financeiros e psicológicos) pode ajudar. "Agilidade e percepção de ambiente serão fatores-chave para restaurar relacionamentos saudáveis", acredita.

Martiningo, da UnB: o assédio faz com que as empresas tenham dificuldade em atrair novos talentos Na visão de Martiningo, a empresa deve definir claramente o que considera assédio moral no ambiente de trabalho e quais comportamentos não serão admitidos. Para ele, a criação de células de escuta aos funcionários, desvinculadas da hierarquia da companhia, garante o sucesso da gestão. "É preciso ter consciência de que, se o funcionário não tiver espaço de denúncia dentro da própria organização, ele certamente irá procurar os sindicatos, as entidades de classe e, em última instância, o Poder Judiciário. Como sabemos, nenhum empreendedor quer ver a imagem de sua empresa e, conseqüentemente, seus lucros serem prejudicados pela falta de ações que poderiam ser adotadas pela própria organização", finaliza o pesquisador.

Fora da lei 

No Brasil, ainda não existe uma lei nacional para esse tipo de assédio. De acordo com o advogado Gilberto Costa, o assédio moral é uma espécie de dano moral, sendo caracterizado pela reiteração do ato que enseja a indenização correspondente pelo ofendido. Nesses termos, o artigo 5º da Constituição Federal bem como o artigo 186 do Código Civil estabelecem o direito à indenização, não havendo disposição específica sobre o assédio moral, em especial na seara do Direito do Trabalho, na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). 

O pesquisador da UnB Antônio Martiningo Filho lembra que a maior parte das empresas ainda tenta negar a presença do assédio no ambiente de trabalho. "Embora saibam dos riscos de prejudicar a imagem da companhia, algumas preferem ignorar os casos que ocorrem em suas unidades", explica. Ele também destaca que os prejuízos vão além do mal-estar do funcionário assediado: "As empresas ainda não se deram conta de que, além da perda de produtividade causada por licenças médicas e outros afastamentos, o clima de desconfiança e medo que o assédio gera em todo o grupo de funcionários faz com que a organização perca excelentes profissionais e tenha dificuldade em atrair novos talentos para compor seu time". 

Saiba como evitar agressões e processos 

Do ponto de vista do empregador 

- Crie um clima de confiança, no qual as pessoas tenham liberdade de falar sobre seus anseios e aspirações
- Propicie um bom fluxo de comunicação entre funcionários e direção 
- Elabore e divulgue políticas e normas de conduta no ambiente de trabalho
- Promova treinamentos e elabore cartilhas para conscientizar os colaboradores sobre as formas e os impactos do assédio moral no trabalho
- Trate de forma adequada os casos denunciados, a fim de garantir o reposicionamento das pessoas que cometeram o assédio e o pronto auxílio às vítimas
- Estabeleça e aplique punições aos funcionários responsáveis pelo assédio, de forma que as pessoas percebam claramente que a empresa tem efetivo interesse em que esse tipo de situação não vire uma prática comum

Do ponto de vista do empregado

- Procure entender o que é assédio moral e busque informações sobre o assunto. A informação é a principal proteção do funcionário
- Não se isole. Procure ajuda dentro e fora da empresa, se for o caso
- Deixe claro ao possível assediador que conhece a política da empresa e seus direitos como cidadão
- Caso se sinta assediado, procure aconselhamento com amigos e familiares. Esconder o fato só piora a situação
- Existem profissionais especializados nas empresas e vinculados aos sindicatos e entidades de classe que podem ajudar

segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014

Tempo de despertar

Imagine dois candidatos disputando a mesma vaga numa empresa multinacional. Um deles possui uma excelente experiên­cia profissional; o outro pode ser classificado como mediano.
Seria normal imaginar que o primeiro leva o prêmio, a não ser por um detalhe: é preciso ter fluência em inglês e o experiente, na outra organização, não precisava ler ou falar nessa língua e tampouco se preocupou em aprender o idioma de Shakespeare. Já o segundo, é fluente em inglês e ainda arrisca o espanhol - e acaba ocupando a vaga.

Situações similares acontecem, ainda, com freqüência, apesar de todo executivo (seja de qualquer nível hierárquico) saber da necessidade de falar outro idioma. Mas o que falta para muitos acordarem e mudarem essa situação? A mesma pergunta é feita todos os dias por Thais Blanco, consultora sênior da Hewitt Associates. Ela conta que ainda se surpreende com o nível e a qualidade da fluência em outra língua de muitos profissionais. "Em muitas entrevistas que fiz, foi possível perceber que apenas naquele momento é que muitos candidatos sentiam a importância de falar fluentemente outro idioma", lembra. Ou seja, a ficha caía com um certo atraso. E o mesmo pode acontecer com a nova geração.
Thais acredita que esses jovens também passam por problemas com outros idiomas e, se não tomarem cuidado, passarão pelas mesmas dificuldades quando entrarem no mercado de trabalho. "Eles até podem ter um pouco mais de facilidade para leitura, mas não para a fluência", observa. "É preciso acordar os pais. 

Atualmente, já existe a percepção de que a criança absorve o idioma com mais facilidade e de forma mais lúdica. Não é algo penoso, mas uma vivência melhor com o idioma."
Em qualquer empresa, as competências de comunicação sempre se destacam com eternos pontos de melhoria. Comunicar-se verbalmente e por escrito com os acionistas, clientes, superiores e subordinados de forma eficaz são atributos indispensáveis em qualquer organização. "Logo, o domínio de outro idioma torna-se um trunfo no ambiente corporativo", acrescenta Mário Fagundes, economista com especialização em RH, que atua há 19 anos como consultor de remuneração.

Mas quanto vale um profissional com fluência em um ou mais idiomas? A Pesquisa Salarial e de Benefícios da Catho Online, coordenada por Fagundes, constatou diferenças salariais significativas entre os profissionais fluentes em inglês. Na alta direção das empresas (diretores e presidentes), a diferença salarial entre os executivos que falam fluentemente inglês e aqueles que não falam é em média 52%. "Por outro lado, apenas 24% de todos os diretores entrevistados falam inglês fluentemente, contra 58% dos gerentes, ou seja, entre os gerentes o domínio da língua é mais generalizado, diminuindo assim a diferença salarial entre os profissionais", complementa Fagundes.

Outro estudo conduzido pelo Grupo Catho reforça essas diferenças. Batizada de "A Contratação, a Demissão e a Carreira dos Executivos Brasileiros 2005", a pesquisa foi feita via internet e respondida por 31.190 pessoas (de trainees até presidentes de empresas) em todo o Brasil.

O levantamento utilizou uma metodologia para medir o peso de diversos fatores na evolução salarial de executivos. Por exemplo, para cada ano ocupando o mesmo cargo na empresa foi registrado um acréscimo médio de 28 reais mensais, no nível de profissional especializado. Entre presidentes, esse aumento é de 162 reais. Já a língua inglesa representa 144 reais a mais por mês, nos cargos mais baixos. No topo da hierarquia, esse bônus pode chegar a quase 950 reais. O domínio do inglês chega a ter maior impacto do que a escolaridade, acentuadamente em níveis mais elevados da pirâmide corporativa.

Há que se registrar que esses valores são para os homens. A triste realidade é que as mulheres têm acréscimos menores em todos os itens pesquisados. Note-se também que apenas 23,65% dos entrevistados trabalhavam em empresas com capital estrangeiro - com faturamentos de 15 milhões de dólares a 100 milhões de dólares por ano. Isso demonstra que a internacionalização das atividades já é uma realidade para as companhias nacionais de todos os portes.

Mercado seletivo

Há nove anos trabalhando na People Consulting, consultoria de recrutamento e seleção de profissionais com foco em TI, Rita Mellone, coordenadora de RH da empresa, confirma a crescente exigência do domínio de outro idioma além do português - no mesmo ritmo que crescem as demandas por maior qualificação do profissional. "O mercado está cada vez mais seletivo", diz Rita, acrescentando que, além disso, está aquecido nesta época.

Ela conta que um grande passo já foi dado quando o assunto é mostrar qual o nível de conhecimento de inglês, por exemplo, por parte de um candidato. Atualmente, é possível perceber uma coerência maior entre o que está no currículo do profissional e o que ele efetivamente sabe sobre o idioma. Antes, nem sempre quem dizia ser fluente tinha esse nível. "Acredito que isso acontecia porque muitos achavam que não seriam avaliados nesse quesito", diz.

Para melhor identificar o grau de conhecimento sobre um idioma de um candidato, a People Consulting resolveu terceirizar as entrevistas em outra língua. "Optamos por contratar um fornecedor especializado para apontar exatamente o nível de fluência e, assim, termos mais segurança na hora de indicar um candidato", conta Rita, lembrando que também é verificado junto ao cliente se realmente o idioma é necessário e qual o nível exigido para a vaga. "Um erro comum no passado era a empresa exigir inglês fluente e o funcionário não precisar usá-lo no seu dia-a-dia de trabalho", diz.

Quem concorda com essa visão é Ugo Barbieri, sócio da Horton International, empresa de seleção de executivos especializada no recrutamento de talentos seniores. "Muitas empresas buscam um super-homem, mas, no dia-a-dia, o profissional só vai usar 50% de seus poderes", explica. E outro idioma, muitas vezes, está fora desse pacote. "Vale ressaltar que o conhecimento de um idioma é a chave de uma cultura e de uma visão de mundo", diz Barbieri. "Se você usa outros idiomas, você está interagindo com culturas diferentes e está dentro da filosofia de vida que o idioma expressa. E cada vez mais é necessário dominar outra língua por estarmos numa economia global", reforça.

Benefício ou investimento

Thais, da Hewitt, vê duas formas de a empresa oferecer um curso de idioma para seus funcionários. Um dos caminhos é como benefício. "A companhia possibilita o aprendizado, independentemente de ser algo importante ou estratégico", diz a consultora. Ou seja, quando o inglês não é fundamental ou quando o profissional já possui uma boa fluência nesse idioma e decide fazer outro curso de línguas. Em casos assim, em empresas multinacionais, geralmente é oferecido o benefício para cursos do idioma de origem da companhia.

Outra forma é como ação de desenvolvimento e envolve investimentos no profissional. "Imagine que a estratégia da empresa mude e seja necessário, a partir daquele momento, ter colaboradores com determinados níveis de conhecimento de outro idioma", conta Thais. "Nesse caso, a empresa vai investir no aprimoramento dessa competência, seja de forma integral ou em regime de co-participação, custeando entre 75% e 80% do valor do curso", observa. E a empresa vai cobrar do colaborador o retorno desse investimento - seja em termos de aproveitamento no curso, no dia-a-dia. "Eu já fiz isso: contratei uma pessoa e investimos num curso de inglês, no sistema de imersão no exterior", lembra.

Uma pesquisa da Hewitt divulgada no fim do ano passado, feita junto a cerca de 145 organizações, mostra que a maioria (61%) das consultadas oferece algum tipo de apoio à educação dos empregados, em grande parte com a condição de ter demanda pela atividade exercida pelo funcionário. O valor médio mensal do subsídio (quando determinado um valor fixo) é de 167,67 reais para ensino médio e 356 reais para ensino superior. Quando se trata de curso de idioma, o valor é 296,89 reais.

Conselhos

Além de poder ter uma remuneração menor, o pior que pode acontecer com o profissional que não fala outro idioma ou fica capenga numa conversa em outra língua é, segundo Marcelo Mariaca, diretor da Mariaca InterSearch, ficar à margem do mercado.
"E como, hoje em dia, o idioma do mercado é o inglês, quem não falar essa língua vai ser como aquela tia velha que sempre existe na família, que não sabe dirigir um automóvel".

Ele comenta que a tal senhora nunca será abandonada nas festas de Natal ou de Ano Novo, por exemplo, mas quando os parentes combinarem comer uma pizza e alguém se lembrar dela, sempre a imagem dessa tia estará associada a um estorvo - alguém terá de levá-la para casa depois. É o mesmo caso com o executivo: por conta dessa falta de competência, ele acaba ficando dependente de terceiros. "E num mercado cada vez mais competitivo, pode ser um problema, tanto para a empresa quanto para ele", diz Mariaca.

Para aqueles que não querem ficar para trás no mercado de trabalho, Mariaca dá alguns conselhos. "Em primeiro lugar, busque um curso intensivo, dentro ou fora do país, numa boa escola que tenha um bom laboratório", diz. O consultor recomenda, também, que o profissional estabeleça objetivos durante o curso. "Mas devem ser metas realistas. A pessoa não vai ser fluente em apenas um ano; isso pode levar mais tempo, um ou dois anos a mais, por exemplo. E talvez nem mesmo o aluno perceba essa fluência, já que se trata de uma evolução gradual."

Por fim, Mariaca pede que todos sejam claros e honestos na hora de elaborar o currículo: se não está fluente num idioma, que isso fique bem claro. "Não tenha medo de colocar que está cursando inglês três vezes por semana, por exemplo", diz, lembrando que, na verdade, a língua que deveria ser aprimorada é o português. "Vejo muitos alunos de pós-graduação escrevendo num português horrível", destaca.

De origem espanhola, mas criado nos EUA e naturalizado brasileiro nos anos 70, Mariaca não esconde um certo sotaque espanhol e admite suas deficiências em português. "Decidi ser brasileiro e tenho de melhorar", conta. Fique tranqüilo, Mariaca, seu recado foi claro o suficiente para fazer muitos executivos acordarem.

sexta-feira, 14 de fevereiro de 2014

O que é Procrastinação?

É frequente a queixa de pessoas que não suportam o próprio hábito de deixarem tudo para depois. Quando simplesmente não deixam para depois, essas pessoas se desviam tanto do objetivo principal durante a preparação para aquilo que deveriam fazer que acabam não fazendo mesmo.

A pessoa que procrastina levanta com o firme propósito de que hoje, decididamente, começará a preparar seu currículo no computador. Bem, mas para começar é importante dar uma arrumadinha na cadeira do escritório que está com a rodinha emperrada. Ok. Deve, para isso, comprar um lubrificante naquela casa comercial maravilhosa onde tem de tudo. Até uma lanchonete onde toma um sorvete delicioso, depois passa na banca de revistas, vai para casa, mas já é hora do almoço. Depois do almoço começa a lubrificar a cadeira do escritório e aproveita para ver o que mais precisa de lubrificação em casa. Já está quase na hora da academia. Pronto. Hoje não dá mais tempo de preparar o currículo.

Chama-se procrastinação a protelação ou adiamento de uma ação decidida ser necessária. Mas evitar tarefas nem sempre é preguiça ou doença. Cogita-se que 80% das pessoas procrastinam com certa freqüência e, como consolo, provavelmente 99% das pessoas devem procrastinar de vez em quando.

A população da Roma antiga já utilizava o termo procrastinação. A conotação desta utilização antiga parecia refletir a noção de que o adiamento da ação ou da tomada de decisão poderia ser algo necessário e sábio, provavelmente porque implicava um processo de tomada de decisão complexo, o qual se opunha a comportamentos impulsivos. No entanto, por motivos não completamente esclarecidos, a procrastinação acabou por adquirir uma conotação moral negativa.

Possivelmente isso se deveu às sociedades orientadas para a realização, produção e sucesso, onde o não cumprimento de tarefas e compromissos dentro de prazos estabelecidos é uma séria ameaça à estrutura cultural. Dessa forma as pessoas que procrastinam são freqüentemente consideradas preguiçosas, irresponsáveis, pouco ambiciosas, indolentes e outros adjetivos pouco lisonjeiros.

Para cerca de 25% das pessoas adultas a procrastinação parece ser um problema significativo e, em 40% dos casos, resulta em perdas financeiras. Estima-se que a procrastinação seja um fenômeno comum a cerca de 70% dos estudantes universitários estudados por Marta Daniela Silva Costa. Cerca de 25% dos alunos pesquisados por ela consideram que a procrastinação é um problema moderado ou grave e que a tendência para procrastinar interfere de forma negativa com as suas médias e com a sua qualidade de vida.

As pessoas tendem naturalmente a procrastinarem a dieta, a arrumação dos armários, check-up médico, entrega da declaração do Imposto de Renda (veja que mais da metade dos contribuintes entrega a declaração nos últimos dias, apesar do prazo de dois meses para isso) e outras coisas que, convenhamos, são bastante aborrecedoras.

A procrastinação merece atenção especializada quando resulta em prejuízo sócio-ocupacional significativo, quando produz acentuado estresse, ansiedade, angústia, depressão e graves sentimentos de vergonha e de culpa pelo não cumprimento de responsabilidades e compromissos.

As razões psicológicas atribuídas à procrastinação não se verificam na clínica psiquiátrica. Diversas explicações já foram tentadas para explicar esse comportamento, tais como medo do fracasso, mentalidade autodestrutiva, perfeccionismo paralisante e muitas outras alegações que soam mais como uma fantasia teórica do que uma realidade constatada. Em termos do prazer, pesar o presente versus o custo e benefício de ações futuras parece ser a dinâmica emocional predominante dos procrastinadores.

Na questão das hipóteses psicológicas uma exceção deve ser comentada; no Transtorno Obsessivo-Compulsivo grave a procrastinação é, de fato, devida ao ritual perfeccionista. Fora disso, as explicações psicológicas que encontramos em inúmeros textos não se sustentam.

Na realidade o que se observa de concreto é o seguinte: a maioria das pessoas não procrastina atividades prazerosas, tais como comer, beber, transar, assistir filmes, ouvir música e assim por diante. Jogar um futebolzinho com amigos não é procrastinado, enquanto fazer o mesmo esforço físico em academia de ginástica tem uma enorme chance de ser protelado. Talvez a psicologia deva começar investigando a contraposição que existe entre o que é culturalmente definido como dever ou obrigação e aquilo que nosso ser privilegia como atividades prazerosas.

Nem sempre é a natureza da atividade quem determina a procrastinação. Atividades prazerosas por si mesmas podem ser procrastinadas quando a pessoa experimenta um certo desprazer pelo compromisso ou obrigatoriedade; “ter que” fazer é mais problemático que a atividade em si. Para algumas pessoas as atividades na academia de ginástica podem ser muito prazerosas, desde que não se sintam obrigadas estarem lá de 2ª, 4ª e 6ª das 17:30 às 19 horas.

Na procrastinação a valorização íntima dos impeditivos para que terminemos algumas tarefas que começamos são muito mais considerados psicologicamente do que os estímulos para terminá-las. Assim, diante dos mínimos empecilhos nossa motivação pode acabar esmaecendo. Isso piora muito quando a atividade em questão tem alguma desvalorização emocional, apesar de se tratar de um “dever”.  É o caso, por exemplo, da entrega da declaração do imposto de rendas, da visita protocolar a uma pessoa de importância meramente social e coisas assim.

Psicologicamente os prazeres valorizam o agora: vadiar agora e trabalhar depois. Atender às obrigações requer um empenho especialmente motivado por conceitos culturais do dever. Mesmo que a execução de uma atividade aborrecedora resulte em benefício futuro, como por exemplo, pagar antecipadamente uma multa de trânsito para usufruir o desconto. O apelo emocional para negarmos esse compromisso que repudiamos pode ser maior que os benefícios do desconto. Procrastinar, nesse caso, é uma espécie de protesto íntimo.

O psicólogo Joseph Ferrari, da Universidade De Paul, do estado americano de Illinois, autor do livro Procrastination e de vários artigos (Ferrari, 2005) estudou esse comportamento em países tão distintos como Austrália, Estados Unidos e Venezuela para comprovar que não se trata de um comportamento de raízes culturais, mas uma conduta intrínseca ao ser humano.

Ferrari faz um comentário bem humorado sobre a tendência natural à protelação citando que “a maioria de nós começa o dia procrastinando, ao apertar aquele botão do despertador que permite ficarmos na cama por mais cinco minutinhos”. A procrastinação e suas conseqüências emocionais talvez resultem da contraposição entre o tempo psicológico de cada um, geralmente em concordância com os desejos, e o tempo social, definido pela cronologia cultural e baseado na racionalidade absoluta.

A falta de autocontrole que acaba fazendo com que as pessoas adiem atividades para as quais deveriam dar prioridade pode parecer uma forma impulsiva de comportamento ou uma perda do senso crítico e racional da situação. Mas o assunto é muito mais complexo. É tão complicado a ponto de encontrarmos freqüentemente textos alegando que “aquele que procrastina prioriza coisas menos importantes em vez de direcionar suas ações para aquilo que seria mais necessário realizar”. Ora, primeiramente devemos nos preocupar em saber o que é uma coisa menos importante, e para quem é menos importante.

O bom senso, estimulado pela psicopatologia, recomenda que a procrastinação deva merecer atenção especial quando produz sofrimento. Os exemplos desse sofrimento são variadíssimos; instabilidade familiar, perda econômica, ansiedade, estresse, sentimentos de culpa, perda da produtividade, baixo rendimento escolar e assim por diante.

Procrastinação e transtornos emocionais

Na psiquiatria quando o comportamento da procrastinação é associado a transtornos esses são, geralmente, de dois tipos; Transtorno Obsessivo-Compulsivo (TOC) grave e Transtorno de Déficit de Atenção (TDAH).

As pesquisas sobre as raízes fisiológicas da procrastinação em geral estudam o envolvimento do córtex pré-frontal. Essa área do cérebro é responsável por funções de execução cerebral, como por exemplo, o planejamento, controle de impulsos e atenção. Ela age como um filtro diminuindo os estímulos capazes de causar distração. A baixa atividade dessa área pode reduzir a capacidade da pessoa se concentrar, resultando em má organização, perda de atenção e aumento de procrastinação. É isso que ocorre no lobo pré-frontal da pessoa com Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH).

Não é tão recente a teoria que explica as disfunções observadas no TDAH como sendo resultado de uma alteração central no córtex pré-frontal, a qual comprometeria a capacidade adaptativa da função executiva (Berkley, 1997). Essa alteração seria um déficit na capacidade de inibir respostas, o que explicaria os vários tipos de comprometimentos no TDAH.

No TDAH, tanto em crianças quanto em adultos, os portadores freqüentemente adiam o início da realização de quase tudo. Esta procrastinação pode agravar muito outros problemas já relacionados ao TDAH, como por exemplo, as desavenças conjugais, problemas na escola, no trabalho e com os amigos.

Nesses casos a procrastinação não é apenas uma condição comportamental, mas psicopatológica e que pode ser tratada com medicamentos e/ou terapia. Medicamentos utilizados no tratamento do TDAH podem melhorar a capacidade atenção e concentração e, dessa forma, melhorar a execução de tarefas. A terapia comportamental pode ser de inestimável ajuda para que o procrastinador tenha novos comportamentos mais adaptados.

Tradicionalmente a procrastinação tem sido associada ao perfeccionismo. Isso é mais ou menos o que acontece no TOC grave, quando a rigidez dos rituais é tão cansativa que acaba por desencorajar o paciente a executar determinadas tarefas. A eventual procrastinação do banho no paciente com TOC se deve aos exaustivos rituais que a doença obriga a realizar. Esses rituais tornam o banho exageradamente demorado e cansativo, fazendo com que o paciente acabe protelando-o seguidamente.