quinta-feira, 26 de setembro de 2013

Ser inovador ou criativo?

Um engano muito comum em algumas palestras e literaturas atuais é a confusão entre sintomas e causas. O exemplo clássico é a confusão feita entre inovação e criatividade. Veja que a criatividade é um sintoma da inovação. É comum observar diversas empresas investindo em programas de incentivo à criatividade na esperança de que seus colaboradores tenham ideias inovadoras, mas na verdade não existe nenhuma garantia que este resultado seja atingido.
Em 1969, Edward De Bono publicou o livro “The Mechanism of Mind”, apresentando pela primeira vez na história um estudo sólido sobre criatividade – o que era tratado até aquela época como algo místico. No livro, Edward explicitou como as redes neurais formam padrões assimétricos com base em percepções.
Mas o cérebro não foi projetado para ser criativo. Na verdade, se o cérebro fosse criativo, ele seria bem menos útil em tarefas do dia a dia. Por exemplo, imagine que ao acordar e abrir o armário você encontra 15 camisas, 8 calças, 5 cintos, 10 pares de meias e 5 pares de calçados. É possível formar 30 mil combinações diferentes, mas será que todas serão adequadas?
O cérebro sabe o que funcionou bem no passado (quais combinações são boas e quais não são) e pode realizar processos semelhantes a estes de forma repetitiva, isto é, criar um hábito.
A excelência do cérebro surge na habilidade de criar e usar padrões ou em rejeitar desvios nestes padrões. Na prática, esta habilidade distingue o nosso cérebro de computadores e sistemas de informação computadorizados.
Novas informações podem ser armazenadas em sistemas passivos ou ativos. Um computador utiliza sistema passivo, pois novas informações são armazenadas em seu disco. Não existe uma combinação de novas com antigas informações, elas apenas têm seus bits indexados e armazenados para uma rápida recuperação. Já o cérebro utiliza o sistema ativo: à medida que novas informações surgem, elas interagem com informações já existentes e se auto-organizam em padrões.
Segundo Edward De Bono, se o cérebro está tão “recheado de padrões”, como podemos ter novas ideias?
Para termos novas ideias precisamos sair destas faixas principais, a faixa dos hábitos. O brainstorm, tão utilizado em reuniões de equipes que precisam ser inovadoras e criativas, é uma alternativa fraca de forçar esta mudança de faixas para algo alternativo. É preciso algo mais forte, métodos mais estimulantes, uma provocação, algo que nos force o deslocamento desta faixa principal – isto é, a mudança de perspectiva e a procura de enfoques não usuais, um processo não linear de raciocínio, para checar suposições e gerar novas ideias.
Algumas estratégias podem prepará-lo melhor para práticas inovadoras. Por exemplo, a leitura é um exercício para o cérebro. Mas o que você está lendo é fora do seu campo de atuação ou experiência? Se não, sugiro que mude seu tipo de leitura para melhorar a construção de novos padrões em seu cérebro e aumentar sua capacidade de fazer conexões. Outra dica importante é o foco. Quando você não está focado e pensando ativamente sobre um problema específico, você aumenta as chances de fracasso quando um estímulo de possível solução aparece (até porque você não sabe quando este estímulo irá aparecer).
Há uma famosa história que afirma que Henry Ford passou diversas noites mal dormidas com um grande problema: ‘Como fazer carros de forma mais rápida e mais barata para atender à crescente demanda?’ Seu estímulo veio em uma visita a um matadouro local, onde surgiu a conexão que permitiu a análise e a posterior divisão do trabalho e o surgimento de sua primeira linha de montagem. Estar com foco no problema e mudar a perspectiva de ver o problema permitiu a seguinte suposição: ‘E se eu montar um automóvel da mesma forma como os açougueiros estão desmontando a vaca?’
Segundo Dave Snowden, grande parte dos executivos, cientistas e quase todos os recém-formados de áreas com viés em negócios acreditam que, se você analisar os dados, isso vai lhe dar novas ideias. Infelizmente, essa crença é totalmente errada. A mente só pode ver aquilo que ela está preparada para ver.
Na prática, existem três condições necessárias, mas não suficientes, para criar um cenário propício a ideias inovadoras: pressão, mudança de perspectiva e restrições.
Um exemplo dessas condições é apresentado no filme “Apollo 13”, de 1995, dirigido por Ron Howard. Neste filme, a espaçonave apresenta uma determinada avaria e começa a perder oxigênio. Não existe um procedimento pré-determinado para esta situação, e o tempo de oxigênio restante é curto. Assim, a equipe em solo deve propor uma solução para não perder os astronautas que tripulam a nave avariada.
Para se chegar a uma saída que salve os tripulantes, os melhores cientistas reúnem-se em uma sala e, com equipamentos equivalentes aos disponíveis na aeronave, precisam pensar em algo inovador e eficaz. Veja que neste exemplo temos a restrição de recursos disponíveis, a pressão do tempo e a mudança de perspectiva, pois pessoas que eles conhecem irão morrer caso o problema não seja resolvido.
É interessante observar que, talvez, sob outras condições, eles nunca solucionariam o problema...

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